Era uma visita típica a um castelo medieval no sul da Alemanha, quando o silêncio característico desse tipo de passeio foi rompido por incessantes e quase enlouquecedores latidos. “Não sei o que aconteceu exatamente, mas a Lisa e o Luca começaram a fazer o maior barulho. Um grupo de turistas chineses parou de fotografar os calabouços e focou na gente, se divertindo com a situação. De repente, um casal desajeitado com dois cães eram a principal atração”, lembra, às gargalhadas, Felipe Pacheco, 25.
Desde 2014, o publicitário paulista e sua namorada, Debbie Corrano, 25, da mesma profissão, viajam pela Europa acompanhados dos seus dois animais de estimação e garantem: “esse é apenas um dos divertidos casos envolvendo os bichos”. Autores do blog “Pequenos Monstros”, que, dentre várias outras propostas, narra as peripécias dos quatro em diferentes países, Felipe e Debbie são representantes de uma parcela da população que vem crescendo no Brasil e no mundo. É só olhar ao redor dos pontos turísticos mais famosos para notar a presença de tutores e pets viajantes.
Ainda não existem dados específicos sobre a quantidade de pessoas viajando com seus animais em comparação com alguma data no passado. Mas, de acordo com Larissa Rios dos Santos, turismóloga e proprietária do site Turismo 4 Patas, desde a sua fundação, em 2003, até este ano, o número de estabelecimentos “pet friendly” catalogados passou de 300 para 1500. Para Larissa, esse aumento é sintomático uma vez que indica inclusive a procura maior por restaurantes e hotéis, itens comuns na lista de planejamentos de quem está pensando em viajar. “Mas, ainda, diria que esse salto tem a ver com a mudança de status do animal de estimação na sociedade. Ele saiu do terreiro e foi para dentro de casa, tornando-se parte da família”, aponta.
Na estrada
Debbie e Felipe se mudaram para a Europa em busca de experiências diferentes. Autodeclarados “nômades digitais”, a residência fixada em um único país nunca foi a proposta e muito menos deixar Lisa e Luca no Brasil. “Desde que os resgatei da rua, eles são minha responsabilidade, jamais pensaria em qualquer roteiro sem eles e fico feliz em saber que estou proporcionando bons momentos aos dois, que já passaram por tanta coisa na vida”, conta Debbie, que elege a viagem pelo sul da Espanha como a mais divertida até então. “Estava fazendo tanto calor e eles adoraram as praias. Como fomos de carro, dava para ir parando”. Para o transporte dos animais, os trens também são opção encontrada pelo casal, que atualmente mora na Hungria e tem se surpreendido com a quantidade de lugares pet friendly no país.
Diferentemente de Luca e Lisa, que enfrentaram longas horas no bagageiro de um avião para chegar à Europa, Luna pôde ir na cabine com os tutores. A yorkshire, bem menor, mora no sul da França com a belo-horizontina Natalia Itabayana e o capixaba Bernardo Junqueira e a família vive explorando regiões e países vizinhos, documentando cada passo no blog “Destino Provence”. “Sempre me lembro da nossa ida à Cinque Terre, na Itália. Fizemos muitas trilhas e ela nos acompanhou praticamente o percurso todo, subindo e descendo as montanhas do litoral da Ligúria”, conta Natalia, enfatizando que a peluda tem um problema em uma das patas e, por isso, manca um pouco.
Nesse sentido, conforme Fernando Bretas, professor do curso de veterinária da UFMG, é importante que os tutores respeitem os limites e a personalidade do animal. “Há bichos que estão mais acostumados a sair do que os outros. É possível perceber se ele está incomodando quando fica cheirando o ar e as pessoas e demais animais excessivamente, aparentando estar inquieto. Não é só porque o tutor gosta de viajar que necessariamente seu pet também vai gostar”, orienta.
Não é o caso de Yamandu, que acompanha Ana Slika em todo tipo de situações, seja conhecendo o centro de uma cidade, seja tomando um banho de cachoeira. As limitações, nesse caso, costumam estar relacionadas aos lugares que aceitam ou não o bicho. “Já deixei de levá-lo ao Rio porque muitas das praias não permitem animais”, conta a fotógrafa, se divertindo com a lembrança do primeiro contato do golden retriever com o mar. “Ele detestou a água salgada, mas adorou brincar de caçar siri. É uma sensação maravilhosa participar dessas descobertas com ele”. A próxima parada deve ser a Paraíba.
Hora de planejar a viagem
Antecedência Empresas aéreas têm regras diferentes de embarque de animais. Verifique todas as exigências antes de comprar a passagem. Animais de médio e grande porte costumam ser despachados junto com as bagagens, enquanto apenas os pequenos são permitidos na cabine. Cada país tem uma legislação para a entrada de animais (leia mais na página 4).
Rotina Animais precisam de uma rotina. Manter horários para alimentação e passeios ajuda na adaptação do bicho aos diferentes lugares. Se a ração precisar ser alterada, faça a mudança aos poucos, mesclando-as.
Adestramento As viagens costumam demandar do bicho o contato frequente com outros animais e pessoas diferentes. Adestrá-lo é uma atitude importante e até essencial para que os peludos encarem tudo de forma mais sociável. Tenha em mente que a presença do bicho vai determinar muitos dos roteiros da viagem.
Mandamentos do pet viajante
Frida já cruzaram meio país. A bordo do carro das sócias Patrícia Faria, 41, e Luciana Moura, 44, as duas cocker spaniel encararam boas horas de viagem de São Paulo até o Rio Grande do Sul. E não foi uma vez só não. Quando viva – Frida morreu há pouco tempo, já idosa, com mais de 15 anos –, as praias de Florianópolis foram algumas das paragens pelas quais a peluda mais gostou de passar, conta Patrícia, que está planejando uma saga agora com as cocker spaniel Sophia e Dalila saindo de Minas Gerais. “Luciana é mineira e queremos contemplar o Estado na próxima aventura. Até porque, Sophia e Dalila adoram pão de queijo”. A gaúcha, que junto com Luciana, montou em 2013 o site “Roteiro Animal” especialmente para auxiliar aqueles que vão colocar o pé na estrada com os pets, lembra, no entanto, que planejamento não é responsabilidade apenas de quem vai levar o bicho para o exterior.