Leonard Cohen aos recados certeiros de cinquentões como Morrissey e Titãs,
passando por nomes recentes e criativos como Juçara Marçal,
Alice Caymmi e O Terno, não falta música de qualidade para todos os gostos
*O Globo
Apesar da crise na indústria fonográfica, que se aproxima de um modelo com os serviços de streaming (o que não tinha acontecido com o download), mas ainda não é sombra do que já foi, a produção musical é cada vez maior, mais variada e, aleluia!, mais acessível.
“Rainha dos raios”, Alice Caymmi
Voz arrebatadora e personalidade: Após a estreia em 2012 num disco que soava mais como promessa do que como pedra lapidada, Alice Caymmi fez uma turnê relendo com ousadia o avô Dorival, num caminho artístico que desembocou em “Rainha dos raios”. No álbum, acompanhada apenas do produtor Diogo Strausz, ela mostra personalidade e uma voz arrebatadora seja cantando Caetano, MC Marcinho ou Michael Sullivan.
“Nheengatu”, Titãs
Aos 30 anos, um tratado de rock sujo: Depois de olhar para o passado com o DVD “Cabeça dinossauro” e a festa dos 30 anos de carreira, o quarteto paulistano pegou o Brasil pela gola com um disco de rock seco e atual, que atravessa assuntos espinhosos como pedofilia, preconceito, pobreza e drogas. Um instrumental pesado e preciso e letras certeiras resumem os furiosos Titãs cinquentões.
Os Titãs em plena forma e vitalidade musical
(Foto: Redutodorock)
“Syro”, Aphex Twin
Experimentações no avesso do pop: Anunciado com uma inusitada campanha de marketing, que incluiu dirigíveis sobre Londres, marcas no metrô de NY e links para a web profunda, “Syro” marcou a volta de Richard D. James, uma das mais excêntricas mentes da seara eletrônica, após 13 anos, com um intrincado mix de ritmos e texturas, tão desafiador quanto fascinante.
“Black messiah”, D’Angelo and the Vanguard
Política, experimentos e um falsete de arrepiar: No apagar das luzes do ano, o cantor D’Angelo (que assombrou o mundo com o disco “Voodoo”, de 2000, e em seguida sumiu) soltou, sem aviso prévio, seu primeiro álbum em 14 anos. Política, funk, jazz, experimentos e um falsete de arrepiar se combinam num disco que deve servir de bússola para os novos talentos do r&b alternativo.
“You’re dead!”, Flying Lotus
Uma onda mística entre soul, jazz e hip-hop: Embalado pela delirante arte do japonês Shintaro Kago na capa e no encarte, o quinto álbum do produtor americano fala sobre vida e morte, enquanto conecta os pontos entre jazz, soul e hip-hop, numa vibrante onda psicodélica, com as participações de Herbie Hancock, Kendrick Lamar e Thundercat. Transcendental.
“LP 1”, FKA Twigs
Um brilho que chegou até os tabloides: Etéreo e narcótico, o álbum de estreia da cantora britânica levantou a poeira do esquecido trip hop e apontou novos caminhos para o r&b, ecoando de Björk a Siouxsie Sioux. A luz dessa nova estrela chegou também, inadvertidamente, ao universo dos tabloides, como namorada do ator Robert Pattinson.
“World peace is none of your business”, Morrissey
Fígado e coração em canções memoráveis: Em ano intenso, no qual revelou ter enfrentado um câncer e, só para variar, brigou com sua gravadora, o cantor dos Smiths deixou um dos pontos altos de sua carreira solo. Ferino como nunca, dramático (à beira do macabro) e com renovado desprezo pelas convenções sociais, Morrissey usou fígado e coração em canções lapidares como “I’m not a man” e “Staircase at the university”.
“Encarnado”, Juçara Marçal
Radicalidade no som e nos versos: A cantora do Metá Metá (com trajetória que inclui trabalhos como A Barca) fez sua estreia solo talvez no álbum mais radical do ano (em poesia e sonoridade). No disco, Juçara Marçal se lança — apoiada sobretudo na riqueza cheia de arestas de Kiko Dinucci (guitarra) e Rodrigo Campos (guitarra e cavaquinho) — em canções que têm como tema central a morte.
“O terno”, O Terno
Experimentalismo no formato pop: Em seu segundo disco, o trio paulistano O Terno confirmou a inteligência bem-humorada e o vigor rock’n’roll da estreia, de 2012. Mais maduros, levaram a cabo a ideia de fazer experimentalismo dentro do formato pop, com boas doses de psicodelia e soul. De quebra, soam como um power trio dos melhores e têm um ótimo compositor, o vocalista Tim Bernardes.
“Popular problems”, Leonard Cohen
Voz profunda que ecoa poesia e experiência: Poeta de um mundo de Deus lá em cima ou inferno lá em baixo, o trovador canadense de 80 anos volta ao disco com muito para dizer. Ecoando a experiência de quem nessa vida tudo viu, a voz gutural e esfumaçada de Cohen caminha por entre corais gospel e pianos elétricos ao longo de uma substancial coleção de canções.