Ganhou de presente do padrinho uma passagem para Curitiba, onde reside o cantor. Assim, poderia conhecer e ver in loco o seu ídolo maior durante uma apresentação. Escreveu-lhe contando a novidade. Tudo devidamente esquematizado, malas prontas, roupas escolhidas a dedo e a expectativa enorme de realizar seu desejo.
– Castellani, aí vou eu!!!
Naturalmente, foi umas das primeiras a chegar. Apresentou-se ao cantor e amigo virtual, que, educadamente, lhe dispensou as devidas atenções. Praticamente em cima do palco, com a emoção transbordando pelos poros, minha amiga se empolgou tanto que caiu, ou melhor, se estatelou no chão, quebrando o tornozelo e algumas costelas. Carregada, saiu de ambulância para um hospital.
– Tu deves operar agora, disse-lhe o médico. Nos passe o contato de algum familiar…
– Doutor, eu não sou daqui…
– Mas nenhum conhecido? Nada?
– Bom, eu tenho um amigo…
Horas depois, foi embarcada de volta a BH num serviço de emergência. A cirurgia seria realizada em Minas. Na cabeça atordoada, a lembrança do cantor visitando-a no hospital para depois, preocupado com a fã enlouquecida, acompanhá-la ao aeroporto.
Diverti-me ouvindo essa história, que, apesar dos pesares, teve um final feliz. Também já fui jovem e tiete, já viajei atrás de ídolos, principalmente os de futebol. Já enlouqueci a minha mãe e depois, como mãe, paguei os meus pecados.
Tinha horror quando conjuntos de rock vinham ao Brasil, ou melhor, ao eixo Rio-São Paulo, já que Belo Horizonte nunca, never, entrava no roteiro de shows de grande porte. E minhas filhas, com os colegas, cismavam de ir a esses megashows, deixando-me, naturalmente, mega-dores de cabeça.
Num desses, chegaram à fila com 12 horas de antecedência. Disseram que era para garantir o lugar na grade. Descobri que grade era grade mesmo, aquela coisa de ferro, espremedora de gente, divisa entre o cantor e a multidão, guardada por policiais e um bando de enlouquecidos gritando embaixo. E elas lá, cada uma com seus três meios-metros e pouco, no meio de 30 mil empolgados. O jeito era entregar pra Deus e acender vela para o anjo da guarda.
Outro dia, na TV, estudantes entusiasmados eram entrevistados antes de um show. Estavam na fila desde as oito da manhã, para um evento que começaria às dez da noite, tudo isso para pegar seus lugares na grade, como faziam minhas filhas. Vejo que malucas não eram apenas elas.
Nunca me apaixonei por cantores. Havia um Peter Frampton que eu achava lindo, mas era tanta areia pro meu carrinho de mão que não me permitia sequer sonhar com a figura meio loira e cabeluda que despertava frissons.
Vejo que determinadas reações são típicas de mulheres. Não é usual encontrar um homem se descabelando por uma Cameron Diaz ou uma Ivete Sangalo, dando piti e desmaiando, como acontecia nos shows do cafonérrimo, mas atraente, Sidney Magal (de 30 anos atrás, claro!).
“Ah! Eu te amo! Ah! Eu te amo, meu amor. O meu sangue ferve por você!” . Pronto, meia dúzia no chão. E a cigana Sandra Rosa Madalena? Outra leva. Quantas dariam a vida para ser a tal cigana!
E lembro quando uma amiga, aos gritos, me chamou para ver na TV o novo conjunto que despontava nas paradas: o RPM.
– Laurinha, olha esse cara! Pelo amoooor de Deus! – foi seu comentário ao ver pela primeira vez, trocentos anos atrás, o cantor Paulo Ricardo.
Pois é; o tempo passou. O Peter Frampton vou ver se ainda existe, o Paulo Ricardo mudou de estilo, “encafonou” e engordou um pouco, mas ainda é interessante. O Magal continua cafona e engordou horrores.
Entendo os fãs e suas reações. Entendo o que levou minha jovem amiga a ir para o Sul do país. O que a fez quebrar o tornozelo e algumas costelinhas.
Ah, paixões… Essas deliciosas e platônicas paixões…